sexta-feira, 26 de dezembro de 2014

Missa do Galo

Este ano decidi surpreender a minha mãe e alinhei com ela na Missa do Galo. Na verdade, foi a fuga possível para imprimir nicotina no meu humor. Quando entrei na igreja havia malta a cantar. E assim continuou por mais 20 minutos.  As pessoas cantavam e balançavam, de braços cruzados, com os olhos semicerrados. Por momentos achei que me tinha enganado no spot e que o pessoal tinha ido para ali curtir a moca. 
De 30 em 30 segundos vinha um padre da sacristia espreitar. Devia estar a ver se tinha casa cheia para começar a actuação. A plateia ficou tão compostinha que apareceram 3 padres. O primeiro que falou deixou logo bem claro que o vinho que bebeu ao jantar era dos bons: "Jesus nasceu senhor para se fazer menino". Ninguém reagiu, por isso devo ter sido a única a lançar um risinho e a achar que se tinha enganado.
Esse padre intercalou o discurso com outro, espanhol, cujo tom grave tive dificuldade de dissociar dos monossílabos dos filmes pornográficos. O terceiro só sorria, com as maçãs rosadas, tamanha erar a bebedeira.
De vez em quando vinham pessoas ler passagens do novo testamento. Gostei muito da passagem que uma ucraniana foi ler. Lá no meio foi possível ouvir o nome "Madalena" e não pude deixar de achar piada que tivessem atribuído aquele trecho a uma senhora de profissão duvidosa. 
O primeiro padre recuperou as rédeas e discursou mais uma vez. Foi notória a sua frustração por ter feito o voto de castidade. "Vós, que podeis procriar, ao contrário de mim, enfim. Se bem que para nada é tarde, apesar dos meus cabelos brancos".
Há muito tempo que me destreinei da dinâmica do senta-levanta-benze-ajoelha-reza da missa, por isso nas últimas vezes tenho-me abstido de comportamentos arriscados mantendo-me em pé e calada. Mas desta vez distraí-me com a cotovelada da minha mãe e lancei-me a fazer aquilo que deviam ser três cruzes a começar da testa e que acabou em cinco cruzes, proporcionando a todos uma passagem épica do matrix reloaded.
O padre prosseguiu com a justificação do José na estória. Um visionário do instituto da adopção. Depois avisou que a seguir à hóstia se seguiria um momento de adoração ao menino. A minha mãe perguntou-me: "Vais beijar o menino?". "Não, mãe". "Oh. Porquê?!", perguntou ela como se lhe tivesse acabado de anunciar o nascimento do messias. "Vou esperar pela Páscoa". E ela, em vez de se contentar: "O quê? Pela Páscoa? Não estou a perceber". Tive que responder. "Mãe, porque na Páscoa o homem já tem 33 anos e está no ponto". A senhora contorceu-se toda para controlar o ataque de riso. 
No final, estava já eu a topar o menino de 1,80m da outra bancada, ao lado da sua namoradinha entediante, foram ligar as luzes do presépio, uma réplica fiel, segundo o padre, dos acontecimentos. Fiquei então a saber que a Maria teve a criança sob luz eléctrica e com óptimas condições sanitárias. Só faltava o símbolo da CUF no telhadinho. 
Foi muito giro. Para o ano não falho. É sempre bom estar num sítio sem ser a única que encharcou ao jantar.

MM



terça-feira, 16 de dezembro de 2014

Preocupações natalícias

Campanhas de Natal 'contribua para um inverno mais quente'. Apetece-me responder que dinheiro não tenho, mas se puder contribuir com massa adiposa, pelo menos três famílias numerosas poderão ter um vislumbre dos trópicos até Maio.
Já estou para aqui a engendrar uma boa desculpa para só me apresentar em casa dos meus pais no dia 24 à hora de jantar e para voltar no dia 25 logo depois do almoço. É que se for antes e vier depois disso, triplico as probabilidades, já por si gigantescas, de me transformar numa nova espécie marinha.
Não participo na feitura das iguarias natalícias há muito tempo. Mas apercebo-me que é costume ser-me incumbida a sua travessia da cozinha para a sala. E nessas viagens muitos exemplares não chegam ao destino. Já de barriga cheia, mas porque o dia impõe e a gula concede, continuo a comer noite dentro como se estivesse a armazenar mantimentos para 6 meses no deserto.
Assim, se for só chegar e atacar o bacalhau (que também já deixou de ser singelamente cozido com couves para passar a ter uma confecção à moda do Chef-sem-noção-das-putas-das-calorias-que-aquilo-leva), há uma pequena esperança de evitar a tragédia.
Já pedi à minha mãe para colocar etiquetas com  informação nutricional em cada travessa. Mandou-me delicada e silenciosamente à merda. Não percebo. Os tempos mudam. Mas a minha mãe não. Continua a testar a minha resistência sem respeito pelos direitos do consumidor.
Depois vem a passagem de ano. E a frustração de não caber no tamanho S. Quiçá nem num M. Ninguém sabe, mas o Apocalipse começará nos provadores da Mango, com uma mulher de olhos raiados a experimentar o L, que é como quem diz 'Extra Large Woman in progress' e nisto, à primeira cedência do fecho, aparece uma equipa do National Geographic para atestar a sobrevivência dos mamutes à época glaciar.
E antes que me acusem de ter problemas psicológicos, aviso que vou agorinha reconfortar o ego com uma tablete de chocolate, formato familiar.
(Mas depois vou à Mango e foi um prazer andarmos por cá).

MM